Amparado pela Lei Pelé, goleiro obtém direito a romper contrato com clube de futebol carioca - CSJT2
Processo foi julgado na Seção Especializada em Dissídios Individuais do TRT da 1ª Região (RJ)
09/08/2021 - A Seção Especializada em Dissídios Individuais - Subseção II (Sedi-2) do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ) concedeu parcial segurança ao mandado de segurança impetrado por um goleiro da categoria de futebol profissional do Clube de Regatas Vasco da Gama e deferiu a rescisão do contrato de trabalho. O atleta entrou com pedido de antecipação de tutela, negado em primeira instância, para que fosse reconhecida a ruptura de seu contrato de trabalho por mora contumaz. Por maioria, o colegiado deferiu a tutela antecipada requerida, pois entendeu que mesmo não sendo o mandado de segurança instrumento adequado à discussão sobre os motivos da rescisão indireta, o centro da discussão é o direito à dissolução contratual por parte do jogador, liberdade assegurada pela Lei 9.615/98 (Lei Pelé).
O goleiro ajuizou ação trabalhista, alegando que desde 2017 o clube não recolheu as parcelas referente ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), não pagou diversas verbas trabalhistas. Requereu, em sede de tutela antecipada, a extinção do vínculo empregatício, por culpa grave do Reclamado e a liberação definitiva do atestado liberatório.
O atleta profissional baseou seus requerimentos na Lei Pelé, que prevê a rescisão indireta por atraso no pagamento dos salários por período igual ou superior a três meses e de ausência do recolhimento das contribuições previdenciárias e das contribuições devidas à conta vinculada no FGTS. Segundo o jogador, a manutenção do vínculo esportivo com Vasco da Gama prejudicaria a sua carreira. Requereu também a expedição de ofícios à Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e à Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro (FFERJ) para que fosse registrada a extinção do vínculo.
O juízo da 38ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, deixou de apreciar a tutela antecipada até o recebimento de manifestação contrária por parte do clube. Ademais, verificou a ausência de satisfação dos pressupostos do art. 300, do CPC, dado que segundo o magistrado, a prova pré-constituída nos autos foi insuficiente para atestar de forma inequívoca as alegações autorais. Inconformado com a decisão, o jogador impetrou mandado de segurança.
Em sede liminar, a desembargadora relatora Marise Costa Rodrigues, expôs que há previsão legal específica que autoriza a ruptura do contrato de trabalho entre atletas profissionais e clubes em caso de atraso ou inadimplemento das obrigações contratuais e que restou comprovado, por meio de prova documental, o inadimplemento de contribuições previdenciárias e de contribuições devidas à conta vinculada no FGTS atinentes a, pelo menos, dezoito meses. Assim, deferiu parcialmente a tutela antecipada requerida para autorizar a ruptura do contrato de trabalho discutido nos autos da ação trabalhista originária com a data de 24.07.2020, além da expedição dos ofícios requeridos.
Agravo
Inconformado com a decisão, o clube pediu a sua reconsideração através de agravo regimental, argumentando que a manutenção do deferimento da tutela antecipada, geraria dano irreparável e que eventual mora relativa ao período da pandemia do Covid-19 deveria ser relativizada e não poderia gerar a rescisão indireta do contrato de trabalho, uma vez que o que se busca é a preservação do emprego.
A Seção Especializada em Dissídios Individuais - Subseção II (Sedi-2), sob a relatoria da desembargadora Marise Costa Rodrigues, decidiu por maioria, manter o deferimento da tutela antecipada com a consequente rescisão do contrato de trabalho do jogador e julgar prejudicado o agravo interno interposto, por perda de objeto.
Em seu voto, a relatora aduziu que não houve alteração no quadro fático-jurídico delineado na decisão questionada, que ensejasse sua reforma. Entretanto, destacou ser “evidente que a ação mandamental não é a sede adequada à discussão acerca modalidade da ruptura contratual” mas que o mandado de segurança em questão não diz respeito especificamente à rescisão indireta do contrato de trabalho desportivo, mas sim ao direito à dissolução contratual pelo atleta profissional.
“Está em jogo o direito à dissolução contratual pelo atleta profissional, o que lhe é assegurado como princípio básico do desporto, no sentido de garantir-se a livre prática do desporto de acordo com a capacidade e o INTERESSE de cada um, como fixado no art. 2°., IV, da Lei 9.615/98, o que se resume em uma palavra: LIBERDADE”, enfatizou. A magistrada reconheceu como preenchidos os requisitos para antecipação dos efeitos da tutela, explicando, nesse caso, haver risco de prejuízo para a carreira do atleta, com a perda de um possível contrato com outro clube, além de haver nos autos prova inequívoca do reiterado e prolongado descumprimento das obrigações contratuais o que autoriza a ruptura do contrato de trabalho por culpa patronal.
Com base em jurisprudência firmada pelo TRT/RJ, a desembargadora concluiu que o caso revela a existência de direito líquido e certo do jogador, que merece proteção contra ilegalidade ou abuso de poder. Em sua decisão final, a magistrada concedeu parcialmente o mandado de segurança, autorizando a ruptura do contrato de trabalho e determinando a expedição de ofícios à CBF e à FFERJ para o registro da extinção do vínculo profissional do atleta.
Após a decisão sobre o mandado de segurança, o juiz substituto da 38ª VT/RJ José Alexandre Cid Pinto Filho, em sede de sentença, confirmou a tutela antecipada e a rescisão indireta, declarando extinto o vínculo entre o goleiro e o clube em 24 de julho de 2020, além de condenar a agremiação a pagar cerca de R$ 1 milhão pelo inadimplemento das verbas trabalhistas ao jogador.
Fonte: TRT da 1ª Região (RJ)